terça-feira, 10 de agosto de 2010

O que há por trás da clonagem e da utilização de células-troco

“A vida humana deve ser respeitada desde o seu inicio, e isso deve ser assegurado pelo Direito e defendido pela verdadeira ciência”

Desde 24 de janeiro de 1997, quando foi comunicado ao mundo o sucesso do processo de clonagem através do qual nasceu a ovelha Dolly, vários setores da sociedade começaram a debater sobre a aplicação dessa técnica em seres humanos. Inicialmente, as discussões se davam em torno da possibilidade de produzir clones para a reposição de órgãos. Essa possibilidade, conhecida como clonagem humana reprodutiva, embora se apresente com preocupações terapêuticas é, sem duvida, absolutamente repulsiva do ponto de vista ético. Em primeiro lugar, ela fere a estrutura ontológica do ser humano, que não se reduz a um meio terapêutico; em segundo, a compreensão antropológica engloba muitas outras funções além da biológica e, em terceiro, essa possibilidade abre caminho para a discriminação, ao distinguir, contra naturam, seres humanos constituídos da mesma substância. O ser clonado não possui, em relação ao doador da célula, somente o mesmo conteúdo genético. Ele possui também a mesma dignidade, e, sendo assim, utiliza-lo como objeto de reposição constitui uma grave violência contra o ser humano .
Já a finalidade terapêutica da clonagem, apesar de muito debatida no campo ético e jurídico, sempre foi apresentada por seus defensores com justificativas muito distintas daquelas oferecidas pela clonagem reprodutiva. A questão não está na distinção das finalidades da clonagem ou nas suas respectivas justificativas. A questão é saber quando e por que essa distinção surgiu.
Do ponto de vista ético, o que se discute não é o produto da clonagem, mas seus princípios. Ao classificar o processo como reprodutivo ou terapêutico, não estão sendo levados em conta os meios, mas unicamente os fins. Não se pode esquecer que, no inicio, a clonagem reprodutiva se apresentava com uma finalidade terapêutica. A finalidade pode variar, mas em ambos os casos a intenção é formar, a partir da fusão entre uma célula somática e um óvulo sem núcleo, um embrião com as mesmas características do doador da célula. De qualquer modo, será imprescindível o uso do embrião e conseqüentemente, a ruptura do desenvolvimento da vida humana, que se inicia com a fusão dos gametas.

Pesquisas com células-tronco: quais os limites?

Diante dos problemas éticos impostos pela clonagem, seja ela reprodutiva, seja terapêutica, o desenvolvimento de pesquisas com células-tronco, presentes nos organismos já desenvolvidos, surge como uma possibilidade frente à utilização de embriões clonados. A técnica é, do ponto de vista bioético, plenamente admissível e não apresenta as interrogações existentes no processo da clonagem. Todavia, embora não se faca necessário o uso de embriões para a obtenção das células-tronco, para alguns especialistas, a eficiência terapêutica é maior quando essas células são extraídas durante o processo de embriogênesis. Aqui estão presentes os mesmos questionamentos éticos relacionados ao processo de clonagem.
Entre os que defendem a clonagem e o uso de células-tronco embrionárias, encontram-se aqueles que entendem ser um desperdício um simples descarte dos embriões obtidos através da inseminação artificial. Para estes, se a destruição dos embriões é inevitável, porque não aproveita-los para retirar o material que interessa. Esse posicionamento, pautado num propósito “beneficente”, é claramente utilitarista, uma vez que não consegue perceber a real teologia embrionária. A fecundação tem como fim elementar e essencial nascimento de um novo ser e não o de prover banco de órgãos. Alem do mais, esse argumento é falacioso, uma vez que não questiona o destino dos embriões que sobram da fertilização in vitro.
Para defender o uso das células-tronco embrionárias, também é comum a distinção entre embriões “naturais” e “artificiais”. Os “naturais” seriam aqueles originados da fusão entre o espermatozóide e um óvulo, processo conhecido como fecundação. Já os “artificiais” são aqueles produzidos através da fusão entre uma célula somática e um óvulo sem núcleo.
A partir dessa distinção, alguns especialistas defendem o argumento de que os embriões “artificiais” não são, de fato, embriões, uma vez que não são constituídos pela fusão de duas células com informações geneticamente distintas. Para esses especialistas, que defendem o uso de células-tronco embrionárias, o processo de produção artificial de embriões em nada se aproxima da fecundação. O problema aqui está no fato de que, por esse processo seguir as mesmas etapas de uma fecundação ordinária, nada impede que se reproduza daí um clone. Alem do mais, a diferença no processo de fusão não implica numa diferença ontológica dos seres gerados. Em ambos os casos, o resultado poderá se a geração de uma nova vida. Sendo assim, não se justifica eticamente, sob qualquer aspecto, a utilização de embriões, “naturais” ou “artificiais”. O embrião, mesmo aquele chamado de “artificial”, no pode ser tratado simplesmente como um recurso biológico.

Dignidade humana desde o princípio

É necessário observar que a dignidade humana deve ser respeitada em qualquer etapa da vida humana que tem mais valor. Se houvesse um tal critério, ele certamente, não seria biológico, mas mercadológico e utilitarista. Não se pode atribuir valor à vida humana partindo de critérios exclusivamente acidentais. Mesmo os padrões anatômicos e fisiológicos não são suficientes para definir a importância da vida humana, caso contrário, chegaríamos à absurda conclusão de que deficientes e doentes mentais possuem um valor menor do que aqueles seres ditos “normais”. A vida humana no seu estágio adulto e terminal.
Concluindo, as pesquisas com células-tronco, desde que não interrompam o desenvolvimento da vida humana, são necessárias e seus resultados poderão, num futuro não muito distante, contribuir significativamente para a melhoria da qualidade de vida de milhares de pessoas que sofrem de doenças crônicas e degenerativas adquiridas. Todavia, é um imperativo ético avaliar os limites inerentes aos benefícios oferecidos por algumas técnicas que, prometendo resultados num curto prazo, conduzem a uma discriminação. Os benefícios da ciência não podem, de modo algum, proporcionar, na forma de um dúplice efeito, o extermínio de uma parte da humanidade em detrimento da outra. A ciência, que deve colaborar na busca de uma vida melhor e mais saudável, é incoerente quando, para isso, trilha o caminho da morte e da exclusão social.
No que se refere às pesquisas com células-tronco, toda dificuldade deve ser enfrentada corajosamente para que nenhuma vida, em qualquer etapa de seu desenvolvimento, seja sacrificada. A vida humana deve ser respeitada desde o seu início, e isso deve ser assegurado pelo Direito e defendido pela verdadeira ciência.

Nenhum comentário:

Postar um comentário